Lei de Ohm: Músico Precisa Saber Isso?

POR FERNANDO SANTUCCI
Se você perguntar a um Físico Quântico o que compõe o Universo, ele lhe dirá que é Energia. Peça-lhe para descrever o que é Energia e ele lhe dirá que: é algo que jamais pode ser criado ou destruído, sempre foi e sempre será, é tudo que existe e tudo que já existiu. Então pergunte a um Teólogo sobre quem criou o Universo e ele lhe dirá que foi Deus. Então peça a esse Teólogo para descrever Deus e ele lhe dirá: é algo que sempre foi e sempre será, que jamais pode ser criado ou destruído. É a mesma descrição da Energia.
Mesmo que o seu instrumento seja acústico, não se pode ignorar a eletricidade, ela está presente em nossas vidas. Não estou falando do moderno mundo digital, estou falando das coisas mais elementares como nós mesmos. Nosso cérebro possui uma pequena carga elétrica absorvida da energia dos alimentos que comemos, basta fazer uma tomografia e verá seus pensamentos reorganizarem as ondas cerebrais (frequências), nosso sistema nervoso transporta impulsos elétricos aos nossos membros e nosso corpo retém eletricidade estática assim como as baterias, basta por a mão na tela da TV para comprovar.
Para estarmos em sintonia com o Universo usamos os 5 sentidos para perceber o ambiente que nos cerca. O físico Isaac Newton demonstrou através de um prisma que, assim como as ondas sonoras, a luz também possui matéria e portanto suas frequências também transportam energia. Frequências estas que são capturadas por nossos olhos e ouvidos, e transmitem ao cérebro vibrações agradáveis ou desagradáveis, dependendo das experiências interiores que formam nossa percepção da realidade.
Foi pensando nisso que eu decidi, com essa breve introdução, abrir uma série de artigos sobre a tecnologia por trás dos amplificadores valvulados, que manipulam energia assim como nós.
Muito se fala sobre timbre de guitarra, mas como tomar o controle sobre o destino de seu timbre sem entender como funciona a peça principal da sua cadeia de sinal. Escolhas acertadas podem produzir o timbre que leva sua assinatura. Escolhas equivocadas podem proporcionar experiências desagradáveis para o comsumidor de boa música. Não existem escolhas erradas. O mais importante é não se deixar levar pelos padrões estabelecidos e experimentar para inovar, assim como fez Jimi Hendrix.

Seu Cérebro é um Jardim e Ele Precisa Ser Regado

Não é preciso ser um neurocientista para saber que é mais fácil aprendermos um novo conceito estabelecendo-se uma ligação, ou um vínculo emocional, com antigos conceitos assimilados e experiências passadas. Então eu convido você a entender como a ciência "enxerga" a eletricidade enquanto você rega seu jardim. Veja a tabela abaixo:
AnalogiaHidráulica
(Unidade de Medida)
Elétrica
(Unidade de Medida)
FluidoÁgua (H2O)Eletricidade (Elétrons)
CondutorCano e MangueiraFio de cobre ou Circuito
CorrenteFluxo d'água (Litros/s)Carga elétrica (Ampères)
TensãoPressão d'água (PSI)Energia elétrica (Volts)
ResistênciaLargura interna do cano/mangueira e
Abertura da torneira (mm)
Diâmetro e material do fio e
Resistores (Ohms)
Quando você vai regar o seu jardim você nem pensa em como ou o que você precisa, simplesmente usa a intuição, mas para efeito didático vamos detalhar cada componente envolvido e a interação entre as partes. Basicamente você precisa de um cano (o condutor) da companhia municipal que fornece a água (o fluido), uma torneira (a resistência) e uma mangueira (outro condutor).
O fluxo d'água que percorre a mangueira, medido em litros por segundo, é análogo a corrente elétrica que é um fluxo de elétrons que circula pelo fio de cobre, medida em Coulombs por segundo: os Ampères.
A pressão d'água, medida em Pascal (ou PSI), é análoga a tensão ou energia elétrica, medida em Volts, porque estabelece uma diferença de pressão d'água entre dois pontos ao longo de uma tubulação horizontal que faz a água fluir. De forma semelhante, quando entre as extremidades do fio de cobre houver uma diferença de potencial. Esta diferença de potencial chama-se tensão.
A facilidade ou dificuldade com que um fluxo atravessa um condutor é conhecida como resistência. Limitadores de fluxo, tais como a abertura das torneiras, medida em milímetros, colocadas em canos entre os pontos onde a pressão d'água é medida, são análogas aos resistores, medidos em Ohms. Nós dizemos que a taxa de fluxo d'água através da abertura de uma torneira é proporcional à diferença na pressão d'água em todo o percurso limitador. Da mesma forma, a taxa de fluxo de carga elétrica, ou seja, a corrente elétrica, através de um resistor elétrico é proporcional à diferença de tensão medida sobre o resistor. Além da abertura da torneira, a própria largura interna do cano e da mangueira são fatores limitadores de fluxo, assim como o diâmetro e o material do fio elétrico.
A necessidade de maior corrente, tensão e resistência são escaláveis. Digamos que ao invés de regar o seu jardim você precisa apagar um incêndio em um prédio. No lugar de um cano, você precisará de um hidrante, no lugar de uma torneira, pesadas válvulas hidráulicas e a mangueira precisará ser bem mais larga e robusta para aguentar a forte pressão necessária para se alcançar os andares mais altos. A mesma analogia pode ser feita com os materiais empregados nas estações de distribuição de energia elétrica. O que está fora de nosso escopo.
Diferente da aguá, os elétrons e a corrente elétrica não são visíveis mas podemos comprovar sua existência conectando, por exemplo, uma lâmpada a uma bateria. Entre os terminais do filamento da lâmpada (a resistência) existe uma diferença de potencial causada pela bateria, logo, circulará uma corrente elétrica pela lâmpada e portanto ela brilhará.
A relação existente entre a corrente, a tensão e a resistência denomina-se Lei de Ohm: Para que circule uma corrente de 1 Ampère em uma resistência de 1 Ohm, há de se aplicar uma tensão em suas extremidades de 1 Volt, o que equivale a fórmula: [ E=C.R ]. Esses três conceitos estão relacionados entre si, de tal maneira que, conhecendo dois deles, pode-se calcular o terceiro.
O conhecimento desta lei e o saber como aplicá-la são os primeiros passos para entrar no mundo da eletricidade e da eletrônica.
Antes de se começar a realizar cálculos, há que se conhecer as unidades de medida.

Unidades Básicas

SímboloUnidade de Medida
AAmpère (unidade de corrente)
VVolt (unidade de tensão)
OhmOhm (unidade de resistência ou impedância)
WWatt (unidade de potência)
HzHertz (unidade de freqüência)
FFarad (unidade de capacitância)
HHenry (unidade de indutância)

Prefixos para indicar frações ou múltiplos de unidades

SímboloFração/Múltiplo
p pico (1 trilionésimo 10E-12)
n nano (1 bilionésimo 10E-9)
µ micro (1 milionésimo 10E-6)
m mili (1 milésimo 10E-3)
k kilo (1 milhar 10E3)
M mega (1 milhão 10E6)
G giga (1 bilhão 10E9)

A Lei de Ohm

Muitas pessoas me perguntam sobre a mudança de cabeamento dos alto-falantes dos amplificadores - seja para adicionar mais alto-falantes ou para conectá-los de diferentes maneiras. Acontece um monte de coisas quando a carga dos alto-falantes mudam, e se você souber como a Lei de Ohm funciona, vai simplificar um pouco os esforços do seu projeto.
Eu sempre consulto a documentação que vem com o amplificador, especialmente no que tange a impedância de carga e a impedância dos alto-falantes.

Em que a Lei de Ohm pode nos ajudar?

A gente sempre quer saber quanta potência o equipamento tem ou vai ter depois de modificá-lo. Se soubermos pelo menos duas das variáveis, sejam Watts, Amperes, Ohms ou Volts, podemos descobrir as outras duas.
O gráfico da Lei de Ohm abaixo tem um anel central contendo 4 itens (P, C, R e E) e, em seguida, um anel externo que contém equações matemáticas simples que levam a descobrir os valores dos quatro itens relacionados do anel central. O gráfico é codificado por cores para simplificar seu uso, todas as cores trabalham em conjunto.
Nosso foco vai ser botar esse ferramental teórico para funcionar a favor dos interesses dos músicos, mas nada muito esotérico, por isso vou evitar quaisquer detalhes que não forem realmente relevantes para as nossas necessidades. Vamos usá-la para criar algumas generalizações que nos dizem muito sobre as causas e efeitos do nosso consumo de energia.
Nota: Desse ponto em diante você vai precisar de conhecimento básico de matemática. Qualquer calculadora que puder operar com raiz quadrada pode simplificar um pouco o entendimento.
E (Voltagem) e P (Wattagem) estão usando seus valores RMS.

Aplicação Prática

Como eu descubro quanta potência está indo para meus alto-falantes?
Ou
Por que não fica mais alto quando adiciono mais alto-falantes? Que na maioria das vezes não fica.
Se o seu amplificador tem potência nominal de 100 watts em 8 ohms, podemos achar a variável E (voltagem), olhando para a área azul e encontrar uma equação que usa P (watts) e R (ohms) - Vemos que para obter o nível dessa tensão, temos de multiplicar P x R, e depois extrair a raiz quadrada desse valor. Nesse caso:
P (Watts) = 100
R (Ohms) = 8

P x R = 800

A Raíz Quadrada de 800 é aproximadamente 28.3.

Então, com uma carga de 8 Ohm a 100 Watts, o falante 
vai ver até 28.3 Volts (E = Volts).
Agora, se quisermos acrescentar mais um alto-falante de 8 Ohms em paralelo, que iria mudar a nossa impedância para 4 Ohms (2 falantes de 8 Ohm em paralelo = carga de 4 Ohms), qual potência iria para os alto-falantes? Para isso, precisávamos saber a voltagem que tínhamos para 100 Watts em 8 Ohms. Por quê? Porque a fonte de alimentação (power supply) do amplificador de potência é limitada à quanta voltagem ela pode nos dar. Sabemos que este valor do exercício acima. Para descobrir a nossa mudança de potência, olhamos para a variável P (Potência) no anel central, e as equações em vermelho no anel externo.
R (Ohms) = 4
E (Volts) = 28.3

E elevado ao quadrado / R nos dirá o queremos

28.3 elevado ao quadrado é aproximadamente 800
800 dividido por 4 = 200

Então, se elevarmos a carga do amplificador de 8
Ohms para 4 Ohms, deveríamos ver mais potência, e
nesse caso, ela é 200 Watts. Enquanto a fonte de
alimentação (power supply) puder fornecer 200
Watts, teremos o dobro da potência disponível.
O que acontece se eu colocar alto-falantes de 8 Ohms em série, efetivamente me dando uma carga de 16 Ohms? A equação a ser usada é a mesma, simplesmente conectamos um valor diferente para R.
R (Ohms) = 16
E (Volts) = 28.3

E elevado ao quadrado / R  nos dirá o queremos

28.3 elevado ao quadrado é aproximadamente 800
800 dividido por 16 = 50

Então, se reduzimos a carga do amplificador de 8
Ohms para 16 Ohms, deveríamos ver menos potência,
e nessecaso, ela é 50 Watts. Se a fonte de
alimentação (power supply) pode fornecer 100 Watts,
ela pode manipular 50 Watts com facilidade e
teremos metade da potência disponível.
Tem um efeito aqui que não é óbvio até você olhar para os números. Coisas funcionando em paralelo e com a menor impedância de carga possível te dá mais potência. No caso de funcionar 2 alto-falantes de 8 Ohms em paralelo, você vai perceber em nosso exemplo que cada um tem que dividir os 200 Watts entre eles, nesse caso, cada alto-falante vê apenas 100 Watts, que é o mesmo poder que o alto-falante de 8 Ohms individual via quando era a única carga no sistema. No caso das coisas funcionarem em série, uma mudança mais drástica ocorreu:
  • Primeiro, a potência disponível caiu em 50%;
  • Segundo, a potência disponível que é dividida entre os alto-falantes é 1/2 da potência total, e no nosso exemplo, esses alto-falantes agora só vêm 25 Watts cada. Isso é 1/4 da potência total que o alto-falante individual tem se funcionando sozinho em 8 Ohms ou quando 2 estão funcionando em paralelo resultando em uma carga de 4 Ohms.
Tudo isto implica em que, se simplesmente continuarmos colocando mais e mais alto-falantes em paralelo, temos mais potência. Isto é verdade até atingirmos o limite interno da fonte de Alimentação dos amplificadores - a corrente (C) que ele pode nos dar, ou a corrente (C) que o estágio de saída do amplificador de potência é limitado. O calor tem um papel importante nisso. Quando alguma coisa fica quente, um pouco da potência que deveria ser direcionada aos alto-falantes é perdida. Quanto mais quente ele fica, maior o prejuízo. Muito calor e falhas no estágio de saída de áudio normalmente ocorrem de forma rápida e catastrófica. O modo mais comum de falha que eu já me deparei parece ser um curto-circuito no transformador de saída, que despeja uma tensão brutal nos alto-falantes, e normalmente queima a bobina de vóz em questão de segundos). Esses são fortes argumentos para não se colocar carga alta (baixa impedância) em nenhum amplificador.
Sempre consulte a documentação que vem com o amplificador de potência para ver qual a Impedância recomendada. Normalmente suportam 8 ohms. 4 Ohms também é comum, mas não tão comum que 8 Ohms. 2 Ohms raramente é suportado, porém alguns amplificadores podem lidar com isso como, por exemplo, o Fender Vibro King que despeja 60 Watts em incomum configuração de 3 falates Jensen P10R de 40 Watts e 8 Ohms ligados em paralelo resultando em 2,6 Ohms (por favor, verifique antes de tentar).

Como posso saber quanta corrente todo o meu equipamento está usando?

Pode ser importante verificar isso antes de sair arrastando o fio de extensão para ligar todo o seu equipamento. Você tem que evitar extrair mais corrente do que a que está disponível, se não, você derruba o disjuntor do quadro de força ou causa um incêndio. Se você sabe qual a taxa de potência P (em Watts) de todos os equipamentos que você quer ligar e qual a tensão E (em Volts), então você pode estimar a corrente C (em Ampères) total.
Nos Brasil, a maioria das casas são cabeadas com 15 Ampères por circuito. Algumas tomadas elétricas suportam até 20 Ampères, mas não é bom assumir que você tem mais de 15 Ampères disponíveis. Na maioria das vezes você acaba compartilhando sua energia elétrica com outras coisas, tais como as luzes e os eletro-domésticos na cozinha. Porque você não sabe o que mais está competindo com seu equipamento, normalmente não é uma boa idéia extrair mais de 10 Ampères, isso reserva 5 Ampères para ser usado por mais alguma coisa que esteja ligada na mesma rede elétrica. Olhando o gráfico da Lei de Ohm, você pode ver que se você somar as potências (P) em Watts de todos os aparelhos que você pretende usar, e dividir pela tensão (E) em Volts, você achará a corrente (C) necessária em Ampères.
Espero que o artigo venha a ser útil no seu dia-a-dia. Gostaria de saber a sua opinião e sugestões de temas que você gostaria de ver nos próximos artigos para entender mais sobre amplificadores valvulados. No próximo artigo vamos entender de forma simples e pragmática como funcionam os amplificadores valvulados. Até lá!

Um comentário:

Unknown disse...

Parabéns, excelente Post.
Obrigado por compartilhar seu conhecimento.